26.3.08

simulacros

Foram amar-se pela primeira vez em sua casa, depois de comerem sorvete com gérmem de trigo. Gostavam-se já. No melhor da coisa, um intenso cheiro de flores invadiu o quarto. Passado o ardor, foi naquilo que primeiro falaram. Tão gostoso, aquele cheiro. É uma presença boa, disse ela. Ele concordou, porém pensando no corpo que nele se enrolava. Ele era ali e nada mais. É uma presença boa, pensou.

No dia seguinte, sozinho, sentiu na madrugada um nítido cheiro de merda. Que merda!, pensou. Vinha do nada, como na noite anterior. E se existissem as coisas onde ele punha dúvida, presenças, entidades ou a cascudice que fosse? Se, condicional, existissem, aquele cheiro não havia de ser bom sinal. Que seja. Acendeu um incenso e foi dormir.

O barulho de móveis arrastados despertou-o na manhã seguinte. A faxineira falava sem parar, de modo que pôde ouvir sua cantilena em crescendo desde o corredor até a porta de seu quarto.

- Sua vizinha está cantando no banheiro. Sabonete cheiroso o dela, parece de fada. E o senhor está virando criança outra vez, que negócio é esse de não puxar a descarga?

10 comentários:

  1. É tão bonito se enganar as vezes. Acabamos por perceber coisas que sem "sinais", não perceberíamos.
    Que bom que não foi o amor deles "uma merda".
    Beijo, querido.

    ResponderExcluir
  2. Não, o amor não, Louise!

    Beijo!

    ResponderExcluir
  3. Olá Francisco!
    Sobre o teu trabalho, A noção de virtualidade em Bergson poder-me-ás dizer qual o link, porque precisarei de o referenciar!
    Beijinhos
    Alice

    ResponderExcluir
  4. Prontamente, Alice!

    Esta é a página:

    http://pontocinza.wordpress.com/bergson/

    E este é o atalho para o arquivo:

    http://pontocinza.files.wordpress.com/2007/01/nvb.pdf

    Beijinhos e até sempre!

    ResponderExcluir
  5. Ah afinal está aqui: http://pontocinza.files.wordpress.com/2007/01/nvb.pdf
    Excelente este teu trabalho, depois entrarei em contacto contigo.
    Beijinhos e muito obrigada
    Alice

    ResponderExcluir
  6. Coincidentes :) hehe
    É ainda sobre a importância da IMAGEM...
    Obrigada e até sempre
    Alice

    ResponderExcluir
  7. Quando o encontro é bom, co-incidir é ótimo. =)

    Obrigado, Alice, fico à espera de notícias suas.

    Até sempre!

    ResponderExcluir
  8. a verdade é que homem sempre pensa que a "merda" veio da parte da mulher, jamais viria dele!!!

    esta veio mesmo de dentro dele. e tresandava. bem feito!

    ResponderExcluir
  9. Hahahaha, sim, seria mesmo bem feito!

    Se ele fosse esse tipo de homem...

    Mas o fato é que esse vínculo deriva de uma frase ambígua:

    "Que merda!, pensou, e lembrou da noite anterior."

    Já que não era minha intenção sugerir esse vínculo e já que você é a segunda pessoa a percebê-lo, lá vou eu refazer o texto. Obrigado!

    Não custa lembrar que a heroína da história é a faxineira - que revela ou desvela as respectivas fontes dos simulacros.

    Se é que não estamos a lidar com presenças, é claro. =)

    ResponderExcluir
  10. rs Q privilégio de construção.

    ResponderExcluir