24.12.06

dobra e corte

A dicotomia diniziana dobra/corte evidencia que a matéria não é infinitamente maleável: uma folha de papel, seja lá de que papel, ensina Diniz, não se dobra mais do que sete vezes. Do mesmo modo, ela não pode ser cortada além de certo limite (ainda que seja o limite das partículas elementares). A dobra e o corte são operações que dependem da matéria, mas que encontram na própria matéria seus limites. Os cefalópodes, dizia Geoffroy Saint-Hilaire, comprovam a unidade do plano de composição animal quando entendidos como uma dobra. Mas em que se transformaria um cefalópode que sofresse uma ou duas dobras suplementares? E como conceber a metade de uma partícula? A matéria implica um limite absoluto para além do qual é difícil conceber uma dobra ou um corte. O próprio cérebro que atualiza as dobras - ele mesmo dobras, circunvoluções - é como a folha de papel: um limite.

Mas as dobras e o os cortes conhecem outros limites que não sejam os da matéria? É possível ter a lembrança de uma lembrança e assim por diante; é possível enunciar o sentido do sentido ao infinito; é possível ter a idéia da idéia e também a idéia da idéia da idéia... Quem imporia um limite para as dobras do espírito (o virtual)? Não pode haver paredes nesse labirinto. Também aqui é preciso reverter o platonismo, fazendo do espírito não o limite, mas o (furiosamente) ilimitado, e fazendo da matéria não o ilimitado, mas o limite: maleável, sem dúvida, mas não ao infinito. De direito, minha alma se estende ao infinito, como um lençol sutilíssimo, infinitamente dobrável e cortável; mas o de fato se confunde com a matéria que impõe seus próprios limites à dobra e ao corte.



[triagem:18.11.2004]

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial

eXTReMe Tracker