20.1.15

Je suis? Je ne suis pas?

Sonhei com o papa Francisco. Estávamos num restaurante em Montevidéu, em mesas separadas, muito compridas, dispostas perpendicularmente uma à outra. Mas estávamos próximos um do outro, próximos o suficiente para iniciarmos uma conversa sem que fosse preciso elevar a voz. Chamei-o de 'professor' e, dando-me conta imediatamente da gafe, ou senão do inusitado do tratamento, expliquei-lhe que chamava de professor todos aqueles que poderiam me ensinar alguma coisa. Era mentira: afinal, em tal hipótese, eu teria de chamar qualquer um de 'professor'; mas era uma mentira branca como as vestes papais, e quase tão imaculada quanto elas. Perguntei-lhe, então, o que pensava da mais recente querela sobre a liberdade de expressão, ocasionada pela chacina na sede do Charlie Hebdo. Francisco respondeu-me pausadamente, mas nada do que ele dizia fazia sentido para mim. Surgiu, então, uma moça de seus vinte e tantos anos dizendo-me que meu ônibus estava para sair, e eu a segui, encerrando unilateralmente a conversa com o sumo pontífice sem sequer despedir-me. Ela levou-me a uma rodoviária fantástica onde havia ônibus para todas as partes do mundo; havia, por exemplo, um guichê que vendia passagens para a Itália. Inclinei-me para beijar o rosto da jovem em agradecimento, mas ela deu-me um beijo na boca e eu parti em busca de meu ônibus.

É um sonho típico, penso eu. Lá está você, em outro país, tendo uma conversa respeitável, ainda que informal, com um dos grandes líderes religiosos da humanidade; segundos depois, você foi lamentavelmente grosseiro com um papa que não disse coisa com coisa, beijou uma desconhecida e já está se preparando para atravessar o oceano a bordo de um busão.

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