14.11.15

one more cup of coffee

No supermercado, uma moça diante de uma bancada oferecia aos clientes, de graça, café expresso. Como eu nem mesmo estava ali para comprar alguma coisa, mas para encontrar-me com minha mulher, resolvi tomar um café para matar o tempo. Um homem mais ou menos da minha idade, porém de barriga três ou quatro vezes mais proeminente, puxou assunto.

— Veja que vergonha, disse, apontando para a lata de lixo cheia de copinhos e cápsulas. Quanto lixo inútil!
— É verdade, respondi. Minha mulher e eu conversamos sobre isso ontem mesmo...
— Culpa das corporações.
— De fato, elas não se responsabilizam pelo lixo que produzem...

Enquanto falava, eu estava estudando uma maneira de dizer ao sujeito que a responsabilidade (a responsabilidade, e não a culpa) por essa situação não era apenas das corporações, mas também nossa, que compramos todo tipo de porcaria embalada em plástico. Mas o homem não parecia estar interessado no que eu poderia ter a dizer. As corporações, repetia, mencionando desta vez o rompimento das barragens em Minas Gerais.

No fundo, ele não estava realmente falando comigo; estava apenas tentando aliviar sua culpa. Ele se achava (ou queria desesperadamente considerar-se) uma vítima indefesa das corporações, e não um agente capaz de fazer escolhas. A seus próprios olhos, ele, ao tomar um café de graça, era tão vítima das corporações quanto as verdadeiras vítimas da mineradoras, seja as que morreram, seja as que viram sua vida inteira ser submergida na lama, seja as que moram ao longo da rota dos dejetos e estão enfrentando todo tipo de dificuldades.

Tendo já mitigado sua má-consciência, o homem despediu-se. Fiquei ainda ali, saboreando meu café (sem açúcar) e divagando sobre minhas próprias escolhas, que considero razoáveis. Eu jamais compraria uma máquina de café expresso, pois jogar fora um copinho plástico a cada café tomado está absolutamente fora de questão. Na verdade, eu até viveria muito bem sem café, que bebo uma ou duas vezes ao dia, mas apenas porque minha mulher mo oferece. Minha bebida predileta é o mate, que, assim como o chimarrão, vem embalado em papel. E como uma única embalagem de mate solúvel (de 250g) dura por volta de cinco meses, posso afirmar que meu consumo pessoal de cafeína está longe de ser a pior causa de poluição do planeta.

Nisso, o homem das corporações voltou e... pediu mais um café.


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