a coisa mais bem distribuída do mundo
Sou filho dos anos sessenta, durante os quais vivi minha infância, e
(talvez erroneamente) atribuo a essa circunstância minha repulsa em
relação a qualquer tipo de autoritarismo. É por isso que o único Deus em
que eu poderia acreditar é o spinozista, um Deus que produz (dança?)
mas não "governa".
No entanto, mesmo quem detesta o autoritarismo é forçado a consentir com o exercício (em diversos níveis) da autoridade; e até os punks deveriam admitir que adoram a polícia quando esta intervém para impedir que sejam assassinados pelos membros de outras tribos (nada) urbanas. Como diria Spinoza, quem é incapaz de compreender precisa obedecer. Sem o uso da autoridade (da coerção), nenhum crime seria punido e pouquíssimas crianças fariam o dever de casa (se é que chegariam a freqüentar uma escola).
Todo o problema, portanto, reside em usar com sabedoria aquela imprescindível dose de autoridade sem a qual seria impossível administrar um campo social.
E é nesse ponto que nós, brasileiros, falhamos sistematicamente. Somos talvez o único povo do mundo (sim, esta frase é um puro golpe de retórica, mas periga conter alguma verdade) capaz de combinar, a um só tempo, o autoritarismo mais jeca e a mais lassa falta de autoridade.
Deixarei que o leitor decida por si mesmo os casos particulares de "autoritarismo jeca" e de "falta de autoridade" que seriam capazes de ilustrar a frase acima.
Acabou. Esta postagem acabou. As coisas que poderão ser lidas a seguir são apenas anotações à margem, feitas a lápis, em torno do que acabou de ser dito.
Vivemos numa democracia e uma simples classificação indicativa seria suficiente para calar qualquer polêmica relativa à exposição "Queermuseu". Essa será, por sinal, a linha de defesa da HBO no episódio da exibição diurna de "A festa da salsicha": a de que a classificação etária foi devidamente estabelecida. Os direitos dos artistas terminam onde começam os direitos dos pais e vice-versa. Nem os artistas têm o direito de propor "qualquer obra" para "qualquer faixa etária", nem os pais têm o direito de impor censura à obra de qualquer artista – desde que este não faça uma apologia ao nazismo, não é mesmo? Isso não é difícil de entender. Infelizmente, o autoritarismo, nestas bandas, é a coisa mais bem distribuída do mundo.
E por falar em nazismo... Chega a ser cômico: todo mundo resolveu mencionar a exposição de "arte degenerada", realizada sob o regime comandado por Hitler, mas ninguém, ninguém mesmo, parece lembrar-se (ou tem coragem de lembrar-se) das perseguições realizadas pelo realismo socialista. Um bom antídoto ao esquecimento é o sóbrio e comovente Afterimage, testamento cinematográfico do diretor polonês Andrzej Wajda.
Se a rede de TV mais poderosa do país pode homenagear traficantes em horário nobre, por que estudantes do Pedro II são passíveis de punição por se referirem ao tema na escola?
Eu bem que gostaria de saber se aqueles que são tão ferrenhamente contra a proibição da publicidade de cerveja não seriam, por acaso, os mesmos que são a favor da proibição da maconha. Pois a cultura dos estados alterados de consciência é uma só, meus amores.
Diante da intensificação dos violentos ataques e ameaças às religiões afro-brasileiras, todos deveriam estar urrando de indignação. Como explicar, em meio a uma tagarelice incessante, esse silêncio criminoso? Como? Será que o silêncio se explica... pela própria tagarelice? No me lo puedo creer.
No entanto, mesmo quem detesta o autoritarismo é forçado a consentir com o exercício (em diversos níveis) da autoridade; e até os punks deveriam admitir que adoram a polícia quando esta intervém para impedir que sejam assassinados pelos membros de outras tribos (nada) urbanas. Como diria Spinoza, quem é incapaz de compreender precisa obedecer. Sem o uso da autoridade (da coerção), nenhum crime seria punido e pouquíssimas crianças fariam o dever de casa (se é que chegariam a freqüentar uma escola).
Todo o problema, portanto, reside em usar com sabedoria aquela imprescindível dose de autoridade sem a qual seria impossível administrar um campo social.
E é nesse ponto que nós, brasileiros, falhamos sistematicamente. Somos talvez o único povo do mundo (sim, esta frase é um puro golpe de retórica, mas periga conter alguma verdade) capaz de combinar, a um só tempo, o autoritarismo mais jeca e a mais lassa falta de autoridade.
Deixarei que o leitor decida por si mesmo os casos particulares de "autoritarismo jeca" e de "falta de autoridade" que seriam capazes de ilustrar a frase acima.
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Acabou. Esta postagem acabou. As coisas que poderão ser lidas a seguir são apenas anotações à margem, feitas a lápis, em torno do que acabou de ser dito.
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Vivemos numa democracia e uma simples classificação indicativa seria suficiente para calar qualquer polêmica relativa à exposição "Queermuseu". Essa será, por sinal, a linha de defesa da HBO no episódio da exibição diurna de "A festa da salsicha": a de que a classificação etária foi devidamente estabelecida. Os direitos dos artistas terminam onde começam os direitos dos pais e vice-versa. Nem os artistas têm o direito de propor "qualquer obra" para "qualquer faixa etária", nem os pais têm o direito de impor censura à obra de qualquer artista – desde que este não faça uma apologia ao nazismo, não é mesmo? Isso não é difícil de entender. Infelizmente, o autoritarismo, nestas bandas, é a coisa mais bem distribuída do mundo.
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E por falar em nazismo... Chega a ser cômico: todo mundo resolveu mencionar a exposição de "arte degenerada", realizada sob o regime comandado por Hitler, mas ninguém, ninguém mesmo, parece lembrar-se (ou tem coragem de lembrar-se) das perseguições realizadas pelo realismo socialista. Um bom antídoto ao esquecimento é o sóbrio e comovente Afterimage, testamento cinematográfico do diretor polonês Andrzej Wajda.
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Se a rede de TV mais poderosa do país pode homenagear traficantes em horário nobre, por que estudantes do Pedro II são passíveis de punição por se referirem ao tema na escola?
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Eu bem que gostaria de saber se aqueles que são tão ferrenhamente contra a proibição da publicidade de cerveja não seriam, por acaso, os mesmos que são a favor da proibição da maconha. Pois a cultura dos estados alterados de consciência é uma só, meus amores.
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Diante da intensificação dos violentos ataques e ameaças às religiões afro-brasileiras, todos deveriam estar urrando de indignação. Como explicar, em meio a uma tagarelice incessante, esse silêncio criminoso? Como? Será que o silêncio se explica... pela própria tagarelice? No me lo puedo creer.
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