5.9.17

febeapá 2: the libertarians (again!)

Um dos argumentos mais usados na guerra de desinformação a respeito de drogas ilegais cita a maconha como "porta de entrada" para o mundo das drogas. Quem diz isso jamais se deu ao trabalho de consultar as pesquisas oficiais a respeito do consumo de drogas entre os jovens estudantes brasileiros. A "porta de entrada" para os estados alterados de consciência é, na verdade, o álcool.

Uma dessas pessoas desinformadas é Luiz Felipe Pondé. Contrário à proibição da propaganda de álcool nos meios de comunicação e fiel ao princípio que norteia o pensamento das pessoas que não pensam (aplicar universalmente uma regra sem pesar, um a um, os casos particulares), o filósofo da Folha de São Paulo não demonstra a menor vergonha de, em público, desfiar um parágrafo inteiro de falácias.
"Daqui a pouco se proibirá a publicidade de carros (causam acidentes), aviões (caem), batom (dá vontade de beijar a boca das mulheres e isso pode ser anti-higiênico), churrascaria (colesterol), café (causa ansiedade), xampus (os cabelos reais nunca são tão lindos quantos os das propagandas), bolas de futebol (os meninos podem cair e quebrar a perna), livros (existem livros que propõem coisas absurdas), telefonia celular (já se fala em pessoas viciadas em celulares), televisão (crianças podem ver coisas erradas na televisão), computadores (a internet é incontrolável), turismo (pessoas podem pegar infecção intestinal viajando), água (pode estar contaminada), metrô (pode descarrilar), ônibus (capotam)... A lista é cansativa, como tudo que brota da alma dos idiotas do bem quando resolvem salvar o mundo de nós mesmos."
A lista não é somente cansativa: é falaciosa. E a falácia consiste em pintar quem pensa diferente do colunista como um retardado que, apenas porque defende a proibição da propaganda de álcool, seria capaz de defender a proibição da propaganda de absolutamente tudo que existe.

Ninguém poderá dizer que eu não compreendo o ponto de vista "libertário" de Pondé. Eu o compreendo tão bem que escrevi, aqui mesmo, e há não muito tempo, o texto "O formol nosso de cada dia". Mas uma das coisas que me diferenciam do colunista é que eu faço um esforço para pensar cada problema por si mesmo, e faço esse esforço correndo (alegremente) o risco de não ter um "princípio" geral que dirija meu pensamento.

Eu estava programando mais duas postagens para a série "febeapá", uma dirigida contra os conservadores, outra dirigida contra a esquerda. Mas os menores abismos são os mais difíceis de transpor, e eis que estou escrevendo (novamente) para criticar um "libertário".

Vocês acham que nossos estudantes de 11, 12, 13 anos bebem uísque? É claro que não. Eles bebem é cerveja. Por meio da cerveja, eles entendem plenamente o que é um estado alterado da consciência. As outras drogas entrarão na vida deles por mero raciocínio analógico: de um barato a outro. E não é preciso ser o rei do pensamento estratégico para perceber que, no atual contexto educacional brasileiro, esse consumo precoce é bastante problemático.

É claro que quem trabalha num meio de comunicação qualquer jamais sonhará em contrariar seu patrão, que por sua vez jamais aceitaria abrir mão da receita que a glamorosa propaganda de cerveja proporciona. Tudo isso é compreensível. O que me espanta é a impotência e o servilismo daqueles que, se quisessem, poderiam estar pensando (e não aplicando princípios às cegas). Mas é claro que, aqui, eu talvez esteja sendo otimista demais.



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