23.11.19

1981 + 2019 = 4000 batidas por minuto


Quase aconteceu o que eu mais temia. O experiente time do River não deixou o Flamengo jogar e ficou a minutos de vencer o jogo.

Eu não acompanho futebol regularmente, mas já vi jogos suficientes para poder afirmar que o futebol argentino evoluiu muito. Em vez de socos e botinadas, agora eles fazem faltas violentas usando o tronco e a cabeça, e ao menos na Libertadores essas faltas, mesmo quando chegam a ser marcadas, não rendem cartões amarelos. É como se o "ombro a ombro" (legítimo) virasse um "vale tudo com o tronco". Assim, os argentinos param o jogo à vontade, as faltas não são punidas, o excesso de faltas não é punido... E muito menos a catimba.

Essa continua a mesma. Tendo achado um gol numa indecisão da zaga do Flamengo, os argentinos catimbaram e fizeram cera o quanto puderam durante todo o resto do jogo. Cada lateral era um parto, cada bola nas mãos do goleiro podia facilmente render uma ida ao banheiro.

E a arbitragem até parecia colaborar. Quando o goleiro argentino pegava na bola, o juiz sempre dava as costas para ele — acintosamente, eu diria e corria para o meio do campo, como se dissesse: "Leve o tempo que quiser, pois quando você resolver colocar a bola novamente em jogo, estarei aqui a postos para apitar o jogo."

Aliás, no quesito arbitragem tendenciosa, também houve, em função das novas regras, alguma evolução. Por exemplo, um impedimento claro de um jogador do River só foi marcado quando Diego Alves fez uma defesa difícil. Tivemos ali um tempo valioso (para o Flamengo) desperdiçado numa jogada que não valia nada (ou talvez passasse a valer em caso de gol argentino, nunca se sabe). Mas em pelo menos um impedimento do Flamengo, rapidamente marcado pelo bandeirinha, parecia valer a regra antiga. Como se tornou flexível, ao desembarcar nas Américas, o esporte bretão!

Quanto ao tempo de jogo, de que valeria a cera argentina se o juiz punisse os catimbeiros com 6 ou 7 minutos de acréscimo, não é mesmo? Mas 5 minutos de prorrogação no segundo tempo já seriam demais. O juiz deu apenas 4, e só não deu 3 porque pegaria muito mal. Os caras estão realmente ficando sofisticados. A arbitragem é tendenciosa, porém com muita precisão, para não dar na vista. 

Mas estamos indo rápido demais. Recuemos para os 30 ou 35 minutos do segundo tempo. Faltavam uns 10 ou 15 minutos para o fim do jogo e tudo parecia perdido, mas os argentinos cansaram, Jesus fez boas substituições e o Flamengo, pela primeira vez durante a partida, conseguiu jogar um pouco do que sabe. E bastaram esses últimos minutos para o Flamengo liquidar o jogo. Depois do segundo gol do Flamengo o juiz deu, é claro, mais 1 minuto de prorrogação pois, evidentemente, não podia dar mais 2.

Por fim, tendo compreendido que Gabigol havia sido o responsável por estragar a festa, o juiz o expulsou. É aquela coisa: se um argentino chuta o adversário caído e um brasileiro faz gols, os dois têm de ser expulsos pelo bem do espetáculo. Até agora eu não sei por que o brasileiro foi expulso. A transmissão da Conmebol não mostrou absolutamente nada: possivelmente porque não havia nada para mostrar.

E o VAR? Todos viram a bola no braço de um zagueiro argentino que resultaria num pênalti, mas o VAR considerou que o braço estava junto ao corpo e ficou em silêncio. Será? E se fosse contra o Flamengo? Ainda estaria junto ao corpo o tal braço? Ou...

Parabéns ao time do River. Seus jogadores fizeram o que sabem fazer e quase ganharam mais uma. Ficaram em campo para ver a festa do Flamengo e parecem ter compreendido que, se um time só consegue jogar 10 minutos e ainda assim consegue vencer, é porque merece ser campeão. Embora tenha ganho um monte de vezes a Libertadores, o River, tal como Grêmio e Flamengo, tem um único mundial. Todos esses títulos aconteceram nos anos 80. Hoje em dia está difícil ganhar dos europeus.

Mas nenhum jogo poderia ser mais difícil do que este. Os dois times do Flamengo que foram campeões da América, este e o de Zico, têm o mesmo perfil: times de futebol vistoso e técnica apurada. Não é esse o perfil da Libertadores.(1)

Neste ano de 2019, o Flamengo de Jorge Jesus venceu os habilidosos, os botinudos e os retranqueiros (qualquer semelhança com o filme de Sérgio Leone não é mera coincidência) e foi campeão num jogo inesquecível. Que venha o Mundial de Clubes; será outra parada dura, mas ao menos não haverá Conmebol. Se o Flamengo jogar tudo o que sabe coisa que não fez neste jogo e o Liverpool vier de peito aberto, teremos um novo 3x0.


(1) Por falar nisso, podem anotar: jamais permitirão que o Flamengo chegue à final da Libertadores em 2020 no Maracanã. Se o time não vacilar em algum momento, será garfado. Eles sabem que o Flamengo no Maracanã é muito difícil de bater. Por falar nisso, é estranho escolher o lugar da final com tanta antecedência. Por que não decidir isso ao longo da competição, fazendo a final sempre num país "neutro"? Por que fingir que estamos na Europa? Quem ganha com isso? 

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