20.9.13

Quem te viu, Celso de Mello?

O que mais me diverte na ressaca do julgamento da admissibilidade dos embargos infringentes no STF é a reação indignada de nossos artistas.(1) Descontando a aprovação do ator José de Abreu (contra a qual pesa o fato de que ele é um petista de carteirinha), todos foram unânimes na condenação do voto decisivo de Celso de Mello.

Pouco mais de 20.000 pessoas (pico) assistiram, no dia 18 de setembro de 2013, à transmissão (ao vivo) da sessão do Supremo Tribunal Federal no YouTube. Como eu sei disso? Ora... eu sei porque eu era um desses 20.000 e tantos.

E quantos desses artistas assistiram ao voto de Celso de Mello? Provavelmente nenhum! Pois se o houvessem assistido (e compreendido), teriam assimilado uma lição - uma autêntica e muito bem fundamentada aula - de Direito e de história do Direito.

Para resumir o causo, eis aqui o silogismo dos descontentes:

Premissa 1: Os réus do mensalão agiram contra a lei.
Premissa 2: Quem age contra a lei deve ser punido.
Conclusão: Os réus do mensalão devem ser punidos , mesmo que para isso o próprio Supremo Tribunal Federal tenha de agir contra a lei.

Ou, numa formulação mais popularesca, quiçá mais "artística":


FODA-SE A LEI! 

O QUE EU QUERO É QUE A LEI SEJA CUMPRIDA!


É ou não é divertido?

Quem perdeu a brilhante exposição de Celso de Mello pode recorrer ao vídeo armazenado no canal do STF.

Quanto aos chamados "mensaleiros", que eles tenham o que merecem o quanto antes. O que ninguém merece é viver num país onde o Estado de Direito só é "bacana" até a página cinco.

E antes que alguém me confunda com qualquer merda que eu não sou, remeto o leitor a esta tradução. Dado o contexto, peço especial atenção aos trechos em que Deleuze menciona o "Estado democrático" e os "meios liberais". Se eu preciso - e eu preciso - viver em sociedade, prefiro que esta seja a sociedade descrita no discurso de Celso de Mello. E que funcione para todos, e não apenas para uns poucos.


Carol Castro, Rosamaria Murtinho, Natalia Timberg, Susana Vieira e Barbara Paz:
"Atrizes em luto pelo Brasil" (Fonte: Folha de SP)

(1) "Nossos" artistas é uma amabilidade. Meus artistas são outros.


P.S. (21/09/2013) - A Folha confirmou que as atrizes da foto acima não assistiram ao voto de Celso de Mello. Elas estavam gravando uma novela e apenas souberam do "resultado".

13.9.13

máscaras, liberdade de expressão, anonimato, black blocs

A lei estadual que proíbe o uso de máscaras em manifestações públicas, aprovada pelo ilustríssimo Governador do Rio de Janeiro e contestada pela OAB por inconstitucionalidade, será derrubada em breve.

O quarto parágrafo do artigo 5º da constituição federal diz o seguinte: "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato".

O problema é que é impossível acusar de "anonimato" um cidadão que está nas ruas manifestando seu pensamento. Esteja ele de máscara ou não.

Quem se manifesta de corpo presente jamais pode ser considerado "anônimo". Se o corpo mesmo do manifestante está na rua, oferecido aos olhos de todos, não há anonimato possível. E se, porventura, o corpo "X" (ainda não identificado) cometeu um crime qualquer numa manifestação, basta aos agentes da lei marcá-lo com um inofensivo tiro de tinta (paintball), capturá-lo e forçá-lo a identificar-se.

Aliás, essa é a prova de que o rosto mascarado nada tem a ver com anonimato. Imaginem um PM arrancando a máscara de um manifestante e dizendo: "Ah! Então é você!".

Não. Isso não existe, e existe menos ainda numa cidade com milhões de habitantes como o Rio de Janeiro. A não ser que o manifestante, por uma dessas casualidades quase místicas, seja vizinho ou cunhado do PM que o está detendo, a mera exposição de seu rosto não o identifica. Será preciso saber seu nome, e mais, será preciso saber o número de um seu documento, já que há tantos e tantos nomes idênticos.

No mais, o que define uma máscara? Uma cara pintada é uma máscara? E um nariz de palhaço? E um boné? Cara pintada com nariz de palhaço pode? E barba com nariz de palhaço? Boné e nariz de palhaço é máscara? Ou só quando o sujeito for barbudo?

Nossa constituição está - obviamente - falando de outra coisa, e embora eu não seja jurista, sei muito bem quando alguém está tentando manipular um texto para fazê-lo servir aos seus interesses.

Só não sei o que é pior: o fascismo legiferante de nossas otoridades ou a estupidez explícita de nossos bravos black blocs, que - a pretexto de dar um prejuízo de alguns milhares de reais a bancos que lucram bilhões de dólares - estão afastando os demais cidadãos dos protestos e fornecendo aos poderosos as desculpas de que eles necessitam para aumentar a repressão às vozes das ruas.

num domingo qualquer

Se depender de mim, o programa "Fantástico", da Rede Globo, irá exibir uma entrevista com o etólogo Frans de Waal. Não sei quando isso acontecerá, ou mesmo se acontecerá. Não depende só de mim. Depois voltarei para contar de que diabos estou falando.
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