31.10.18

postagem aleatória XS0891

30.10.18

Uma última palavra sobre a Folha de São Paulo

Antes que algum iluminado estabeleça uma relação entre minhas recentes críticas à Folha e as críticas do presidente eleito ao mesmo jornal, não custa esclarecer que:

(1) Eu costumo criticar bobagens urdidas no executivo, no legislativo e no judiciário, e não vejo razão para não criticar bobagens que leio na imprensa.

(2) Boa parte de minhas críticas à imprensa sempre se dirigiu à Folha (ou aos seus colunistas) porque é o jornal que mais leio e o único de que sou assinante.

(3) Sei ler um jornal e o notório viés político da Folha nunca me incomodou (a não ser, claro, quando assumia um viés explicitamente antidemocrático). Por incrível que pareça, o que acabou acendendo um sinal de alerta foi a sistematicidade com que o jornal "esconde" o clube de futebol mais querido do Brasil. Por várias vezes, fui forçado a pesquisar o jornal para achar uma matéria sobre uma vitória do Flamengo, clube que só aparece na página de resultados quando não vence.

Posso entender que um jornal combata um líder político que detesta. Mas há obviamente algo muito errado num jornal capaz de comportar-se desse modo com o clube de maior torcida do Brasil e, possivelmente, do mundo. Afinal, aqui o problema deixa de ser político e torna-se eminentemente ético. Sei muito bem que sempre foi difícil achar um jornal guiado por pautas, e não por agendas; mas nunca vi, num grande jornal, uma agenda tão esdrúxula quanto essa, e que me deixasse tão desconfiado acerca da suposta "grandeza" de um veículo de comunicação.


P.S.: Não, eu não cancelei minha assinatura da Folha nem estou exortando ninguém a fazê-lo. Uma imprensa meia-boca é sempre muito melhor do que imprensa nenhuma. Bolsonaro sequer foi empossado e já está dando uma de petista.

25.10.18

Pink que te quero pink


Duas horas de show e um telão enorme

que não mostrava Manuel Bandeira

ou Manoel de Barros,

ou Spinoza

ou Nietzsche,

porém

frases e mais frases de Donald Trump

chovendo no molhado da repetição do mesmo dementado que já se viu na TV.



Independentemente de suas convicções políticas, que nem estou pondo em questão,

Roger Waters deveria estudar um pouco.

A borboleta é uma cor que voa

bem mais lindamente que seus porcos.

22.10.18

Por que a Folha de São Paulo esconde o Flamengo?


Já comentei esse tema aqui no blogue e continuei reunindo, ao longo dos anos, algumas provas de que a Folha de São Paulo, deliberadamente, "esconde" o Flamengo sempre que pode. Agora, porém, a coisa ficou tão escancarada que eu não posso deixar de comentar, por uma última vez, esse assunto.

Quem está acompanhando, mesmo que de longe, como eu, o campeonato brasileiro, sabe que o Flamengo subiu ontem para a segunda posição, estando dois pontos acima do terceiro colocado, o Internacional. E o título da matéria da Folha de São Paulo diz que o Palmeiras ampliou a vantagem... sobre o Internacional?

Notem que a manchete não é falsa. Desinformar não é (necessariamente) divulgar inverdades. De fato, o Palmeiras ampliou a vantagem sobre o Internacional, assim como ampliou a vantagem sobre o Flamengo e, enfim, sobre todos os demais clubes que disputam o campeonato. Mas quem está em segundo lugar é o Flamengo e, por óbvio, é o Flamengo que deveria ter sido mencionado na manchete.

O corpo da matéria, como não podia deixar de ser, menciona (duas vezes) que o Flamengo é que está em segundo lugar, mas só sabe disso quem lê a matéria. Quem apenas passou os olhos pelo título foi desinformado e deve estar até agora pensando que Palmeiras e Internacional estão liderando o campeonato. E a verdade é que, mesmo que ganhe o difícil jogo de hoje contra o Santos, o Internacional ficará apenas um ponto à frente do Flamengo.

A conclusão é ineludível. A Folha de São Paulo, de forma deliberada e sistemática, faz o máximo para ocultar de suas manchetes o Flamengo e tudo que diz respeito ao clube. Há uma única exceção a essa regra: quando há uma notícia negativa sobre o clube, como uma derrota, o Flamengo subitamente ganha destaque nas manchetes.

Se eu realmente acompanhasse futebol e lesse a seção de esportes da Folha com assiduidade, seria capaz de escrever um livro inteiro sobre o assunto. Jamais escreverei esse livro, mas deixarei aqui a dica. O tema daria um "estudo de caso" interessantíssimo, pois não apenas diz respeito ao clube mais querido do Brasil, mas também ao provincianismo, à parcialidade e, enfim, à má-fé de um dos mais importantes jornais brasileiros. Já imagino até o título da dissertação: "Varrendo as massas para debaixo do tapete: um caso de desinformação deliberada na imprensa brasileira".



NOTA: Internacional e Santos empataram e, apesar da torcida da Folha (último parágrafo do texto), o Flamengo continua, como ontem, em segundo lugar no Campeonato Brasileiro.

NOTA 2 (27/10/2018): Cinco dias depois, o Internacional tem um jogo a mais (31) do que o Flamengo (30) e até empatou em número de pontos (58), mas, ainda assim, o Flamengo continua na frente com uma vitória a mais e 7 gols de vantagem no saldo. Ao que parece, os fatos resolveram aplicar uma surra descomunal na torcida da Folha.

NOTA 3 (03/11/2018): Duas semanas inteiras se passaram e todos os clubes mencionados continuam ocupando as mesmas posições na tabela. Que chato, não?


18.10.18

O cara da Folha pediu e eu, alegremente, dei (ou: da filosofia como arte de aborrecer a tolice)


Como ensinou Bergson, liberdade não é um mero escolher entre opções previamente definidas. É claro que o voto, esse pequeno naco de liberdade que lhe concedem, pode ser, para o homem das ruas, tudo que ele tem para exprimir sua vontade política. Assim, se é preciso afirmar que é enganoso reduzir a compreensão do conceito de liberdade à simples "liberdade de escolha" entre opções determinadas de antemão, é preciso afirmar também, e ao mesmo tempo, que a liberdade de escolha (materializada no voto de todos os cidadãos) é um dos fundamentos do regime democrático.

No segundo turno de uma eleição presidencial, embora sejam dois os candidatos, não tenho apenas duas opções. Em linguagem filosófica, o terceiro excluído vale para o resultado das eleições, mas não para o meu voto; pois está em meu poder recusar os dois candidatos e não votar em nenhum. Vale lembrar que, num segundo turno, votos brancos e nulos não favorecem ou prejudicam nenhuma candidatura, pois não são levados em conta.

Não fosse trágico, seria cômico observar a sanha acusatória de alguns articulistas da imprensa brasileira contra os eleitores que anulam o voto. Estes são acusados de compactuarem, entre outras coisas, com a destruição do meio ambiente e com a tortura.

Essa aisance em lançar mão de chantagem (tortura?) moral é, por si mesma, reveladora.

Não quero compactuar com a tortura. Não quero compactuar com o crime organizado. Não quero compactuar com seja lá o que for, e a anulação do meu voto exprime precisamente essa recusa. Negar-me esse direito equivale a privar-me da já minúscula parcela de liberdade que me cabe numa eleição. O que haveria de mais autoritário que isso? Como poderia acusar-me de um defeito moral alguém que de antemão nega minha liberdade? Não posso ser forçado a escolher uma das duas opções e ainda imaginar-me minimamente livre. Se assim fosse, deveríamos dizer livre o homem a quem demos o direito de escolha entre ser fuzilado com uma venda nos olhos ou sem ela.

Não consigo impedir-me de sentir, num momento como este, um imenso orgulho de ter dedicado a Henri Bergson uma boa parte de minha juventude: justamente um filósofo odiado tanto pela esquerda (que o acusava de "místico" e "espiritualista") quanto pelo conservadorismo (a Igreja Católica incluiu, já em 1914, suas principais obras no Index Librorum Prohibitorum.) Não custa lembrar que Bergson esteve "do lado certo da História" quando foi preciso e numa situação em que havia, de fato, um lado certo da História.(1)

Aproveito para lembrar que a neutralidade partidária e o voto nulo de um eleitor são coisas bem diferentes. Um partido só tem a ganhar com a neutralidade. O eleitor, ao contrário, arrisca-se a ser odiado pelos dois lados, a ser tachado de omisso e até a ser perseguido em seu local de trabalho. Não estou em cima do muro, como alguns partidos políticos; estou, na verdade, acima do muro. Se os dois lados da disputa são chamados (e com razão) de autoritários, é porque eles trabalham por um fechamento; ao passo que eu, como filósofo, trabalho por uma abertura. Não vou dar meu aval a gente que defende, conforme o caso, a tortura ou a apropriação de um país por um partido político. Mas se as urnas decidiram que é isso que temos para hoje, então façam suas campanhas, defendam suas idéias e tentem, por favor, não matarem uns aos outros. Mas tampouco neguem a ínfima margem de liberdade que me resta, pois, ao fazê-lo, vocês estarão negando a própria democracia.

E isso, claro, é coisa de fascista.




(1) SOULEZ, Philippe. Bergson politique. Paris, PUF, 1989.

9.10.18

rumo ao futuro 2

Estou há dias esperando a repercussão da matéria The Big Hack na imprensa brasileira. Ainda não vi absolutamente nada.

A reportagem, publicada pela Bloomberg Businessweek no dia 4 de outubro, revela que a Supermicro (Super Micro Computer Inc.), uma gigantesca fabricante de placas-mãe para servidores, introduziu um minúsculo chip em placas fornecidas para o mundo todo e que teriam ido parar, por exemplo, nos servidores da Amazon e da Apple. Menores do que a ponta de um lápis, esses chips são capazes de baixar código executável e de "preparar o sistema operacional do dispositivo para aceitar esse novo código".(1)



Note, na ilustração acima, que o chip sequer tem a aparência de um chip, e apresenta-se, por assim dizer, disfarçado de conector (como aquele usado no BIOS). Todos os envolvidos negam as informações, mas há uma investigação sigilosa em curso e 17 fontes anônimas teriam confirmado tudo.

Os detalhes dessa notícia são tão graves e escabrosos que eu vou parar por aqui: detesto sensacionalismo, sobretudo quando baseado (ainda) em especulações. Mas a imprensa brasileira, que ganha para informar, decidiu fazer a egípcia.

Compreende-se; um ataque via hardware dessas proporções é uma notícia desagradável para os defensores das urnas eletrônicas.

Não, os chineses não estão manipulando nossas urnas e, muito provavelmente, ninguém está. Mas, entre o cinismo de uns e a paranóia de outros, há espaço suficiente para uma reflexão coletiva bem urdida e uma correção de rumo para as futuras eleições. Se realmente queremos ser uma das maiores democracias do mundo, temos de avaliar exaustivamente essa escolha em particular.



(1) The Big Hack: How China Used a Tiny Chip to Infiltrate U.S. Companies

 

6.10.18

um simples comentário

Postei um comentário ao texto "Gastronomia brasileira reflete um país tosco", publicado por Marcos Nogueira, em que este se queixa da falta de educação generalizada do paladar do brasileiro. Cito um trecho:
"O brasileiro vive na ilusão de que é um abençoado, mais sagaz e criativo do que os outros povos. Em seu mundinho paralelo, essa esperteza lhe basta para queimar etapas. Estudo? Pesquisa? Não, a fé nos levará à vitória. Haja autoconfiança."
Meu comentário não apareceu na página porque foi submetido à moderação da Folha de São Paulo:
Sabemos ler o texto alheio, ou seja, ler o outro e compreendê-lo? Sabemos detectar o texto mal escrito, ou diferenciar o bem escrito do simplesmente correto? Sabemos analisar uma pintura ou uma foto? Não conhecemos nem mesmo os nossos sentimentos, dos quais derivam nossas ações. Bem-vindo à realidade, amigo. Quem não produz a si mesmo (por exemplo, quem não cozinha sua própria comida e não inventa suas próprias idéias) está condenado a vagar como um fantasma, a mendigar amor, a dar ouvidos a idiotas e a comer porcaria. Um forte abraço.



Atualização (08/10/2018, 22:40): O texto acabou não sendo publicado, mas na Folha isso acontece bastante. Enfim, era só um comentário...

5.10.18

A Hidra de Lerna contra a Mula sem Cabeça

Posso estar errado, mas continuo achando, quatro anos depois, que Marina Silva teria feito um bom governo (certamente não seria o desastre que foi o governo Dilma II). E eu posso estar, mais do que errado, delirando, mas vejo em Marina Silva muitas das qualidades que vejo em Fernando Gabeira.

Noves fora, Gabeira é o político brasileiro que eu mais admiro. Foi às últimas conseqüências na juventude, envelheceu com sabedoria e teve coragem para revelar uma verdade desagradável sobre nossos democratas. Entendeu que o binômio totalitarismo/democracia é muito mais importante do que o cansativo direita/esquerda. E, como se tudo isso não bastasse, é o político que tem a filha mais bacana.
* * *

Meu cérebro tem dois hemisférios, esquerdo e direito, mas fica bem no centro de minha cabeça.

* * *
Desta feita, o centro derreteu. Querem me empurrar goela abaixo um dos mais formidáveis encontros mitológicos das modernas democracias. Como diria Bartleby, I would prefer not to.


3.10.18

rumo ao futuro

Tornou-se mais fácil ameaçar os habitantes das comunidades mais vulneráveis de todo o país, sobretudo em áreas dominadas pelo crime organizado. Na época do voto manual, apenas os mais ingênuos acreditariam que o crime conseguiria identificá-los por meio de garranchos num pedaço de papel; agora, com a urna eletrônica, é muito mais fácil fazê-los acreditar que seus votos poderiam ser rastreados e descobertos.

Enquanto na Alemanha as urnas eletrônicas foram declaradas inconstitucionais, aqui é a impressão do voto que é tida como inconstitucional.

Eu compreendo que o TSE defenda o sistema atual com unhas e dentes e compreendo que seus textos se assemelhem a campanhas publicitárias. Administrar sistemas informáticos é muito mais divertido do que ficar contando uma inimaginável quantidade de papéis. É preciso admitir que as urnas eletrônicas são mais modernas e excitantes do que o sistema manual. Só não servem para a democracia, como explicou com suprema simplicidade o Tribunal Constitucional Federal alemão; mas, aqui, quem se importa?

Não estou dizendo isso para apoiar as teses do candidato A ou B. Não estou pensando no próximo governo, mas nos próximos 100 anos. E estou, claro, aproveitando que ainda é possível mencionar o tema. Em breve (talvez 10 anos?), qualquer declaração que ponha em dúvida a lisura do processo eleitoral será considerada (vejam só) um atentado à Democracia e à Segurança Nacional.

O Brasil pode não ser o "país do futuro", mas está se tornando o grande laboratório das sociedades de controle do futuro. Não conheço outro país do mundo, ou ao menos nenhum país com a importância do Brasil, em que a tecnologia e o autoritarismo estejam a ponto de fazer um encontro tão promissor.

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