30.12.06

song for the youth

Don't call me "drunk".
Call me "a man with a few drops of alcohol in his veins".
Don't call me "black".
Call me "a man with some extra melanin in his skin".
Don't call me "crazy".
Call me "a man who thinks in a different way".
Don't even call me "a man".
Call me "something that I don't know because it's not me".

Trust me: you don't know me.
All you know are your own thoughts about me.
Forget them.
Forget them and try to think on your own.
Forget them and try to feel on your own.
Forget them and try to look on your own.

And - please! - don't call the doctor nor the police
just because I'm crazy, black or drunk:
they know even less than you
about this vast and complex and changing reality
that doesn't belong to you or me or them.

Forget them
and look into my eyes
before we fall asleep
or die.

27.12.06

"Em toda a sua maneira de viver como de pensar, Spinoza estabelece uma imagem da vida positiva, afirmativa, contra os simulacros com os quais os homens se contentam. E não apenas os que com eles se contentam, mas o homem com ódio e vergonha da vida, um homem da autodestruição que multiplica os cultos da morte, que realiza a união sagrada do tirano e do escravo, do padre, do juiz e do guerreiro, sempre a encurralar e mutilar a vida, a fazê-la morrer rápida ou lentamente, a recobri-la ou sufocá-la com leis, propriedades, deveres, impérios: eis o que Spinoza diagnostica no mundo, essa traição do universo e do homem. (...) A vida não é uma idéia, uma questão de teoria em Spinoza. Ela é uma maneira de ser, um mesmo modo eterno em todos os atributos. E é somente desse ponto de vista que o método geométrico adquire todo o seu sentido. Este, na Ética, se opõe ao que Spinoza chama de sátira; e a sátira é tudo que sente prazer com a impotência e a dor dos homens, tudo que exprime o desprezo e a zombaria, tudo o que se nutre de acusações, malevolências, depreciações, interpretações baixas, tudo o que quebra a alma dos homens (o tirano tem necessidade de almas quebradas, tal como as almas quebradas têm necessidade de um tirano)."

Deleuze: Spinoza, philosophie pratique
(Paris, éditions de minuit, 1981, pp. 21/23)
Tradução livre e precipitada. =)

24.12.06

para além do backup

Quando o disco estala
aprende-se na pele:
só temos o que damos.



[triagem:21.11.2004]

dobra e corte

A dicotomia diniziana dobra/corte evidencia que a matéria não é infinitamente maleável: uma folha de papel, seja lá de que papel, ensina Diniz, não se dobra mais do que sete vezes. Do mesmo modo, ela não pode ser cortada além de certo limite (ainda que seja o limite das partículas elementares). A dobra e o corte são operações que dependem da matéria, mas que encontram na própria matéria seus limites. Os cefalópodes, dizia Geoffroy Saint-Hilaire, comprovam a unidade do plano de composição animal quando entendidos como uma dobra. Mas em que se transformaria um cefalópode que sofresse uma ou duas dobras suplementares? E como conceber a metade de uma partícula? A matéria implica um limite absoluto para além do qual é difícil conceber uma dobra ou um corte. O próprio cérebro que atualiza as dobras - ele mesmo dobras, circunvoluções - é como a folha de papel: um limite.

Mas as dobras e o os cortes conhecem outros limites que não sejam os da matéria? É possível ter a lembrança de uma lembrança e assim por diante; é possível enunciar o sentido do sentido ao infinito; é possível ter a idéia da idéia e também a idéia da idéia da idéia... Quem imporia um limite para as dobras do espírito (o virtual)? Não pode haver paredes nesse labirinto. Também aqui é preciso reverter o platonismo, fazendo do espírito não o limite, mas o (furiosamente) ilimitado, e fazendo da matéria não o ilimitado, mas o limite: maleável, sem dúvida, mas não ao infinito. De direito, minha alma se estende ao infinito, como um lençol sutilíssimo, infinitamente dobrável e cortável; mas o de fato se confunde com a matéria que impõe seus próprios limites à dobra e ao corte.



[triagem:18.11.2004]

tríptico

Filosofia

Dama impassível,
impenetrável,
minha puta de
olhos abstratos.

Poesia

Puta de farta carne,
lasciva e fugidia,
que jamais penetro
senão por estupro.

Angústia

Velha rameira
desdentada,
que me morde
quando brocho.



[caosmos:21.07.2004]
[triagem:14.11.2004]

metonímia ou panelas de aço são para sempre

Antes mesmo do casamento, comprariam as melhores panelas e caçarolas de aço, as mais robustas e reluzentes. Não haveria de ser o alumínio que envenenaria o seu amor. E este também seria de aço, ou do que houvesse de mais duro.

Não compraram as panelas. Nunca mais se falaram. E ele, certo dia, deu com as cascas numa loja. Não chegaria a usá-las, pensou. Não haveria quem cozinhasse ou comesse, não haveria amor para alimentar. Inútil havê-las, irracional.

Luziam, porém. Comprou-as.



[triagem:07.11.2004]

belas ou nem tanto

Há mortes estranhas ou desconcertantes, mas poucas rivalizam com aquela que sobrevém no cumprimento de um ofício. As mortes do futebolista em pleno jogo, do orador em meio a um discurso ou do ator no palco revestem-se de uma dignidade comparável à morte do guerreiro de outras eras no campo de batalha. Desse gênero de dignidade na morte o escritor está, por definição, privado. Eis aí mais uma razão para o suicídio de escritores.



[triagem:29.10.2004]

O futuro

é um pesadelo assombrado por todas as espécies que faremos desaparecer. O futuro é uma criança com sede. O futuro é uma menina a tomar hormônios para ser vendida a um cafetão. O futuro são bombas no colo de bebês. O futuro é uma caixinha e também o fogo que a consumirá. O futuro é agora.

O futuro não é. O futuro não está inscrito nas planilhas dos administradores ou nas cartilhas dos políticos. O futuro zomba de todos os impérios dementes que querem durar mil anos. O futuro não pertence aos planejadores, mas aos visionários. A hora de ver é agora.



[triagem:25.10.2004]

23.12.06

f e l i z
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